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sábado, 27 de agosto de 2016

A nulidade do registro de nascimento no contexto da adoção à brasileira

Jéssica Talita Alves RamosRio Grande, 27 de Agosto de 2016
 
Resumo: O presente trabalho tem por objetivo explorar os novos conceitos e visões que, modernamente, se tem dado à noção de “paternidade socioafetiva”, visando analisar as suas repercussões no fenômeno ora denominado adoção “à brasileira”. Almeja-se perquirir acerca das recentes decisões dos tribunais superiores, no que tange à importância da paternidade socioafetiva nos pedidos de desconstituição dos vínculos familiares, haja vista ter havido uma significante diferenciação de tratamento nas soluções destes casos, dependendo, basicamente de quem é o autor do referido pedido, o que traz reflexões acerca do acerto das teses firmadas pelo STJ.

INTRODUÇÃO
A noção de paternidade socioafetiva tem ganhado grande destaque no Direito Civil Moderno, pois amplia o conceito de família, através de novos tipos de vínculos familiares, além dos puramente biológicos.
O desenvolvimento do afeto entre os conviventes tem possibilitado, em sede jurisprudencial, o reconhecimento de direitos ínsitos à relação familiar clássica, tais como, o direito a alimentos, à herança, à pensão, etc.
Outra grande repercussão jurídica da paternidade socioafetiva, da qual trataremos neste trabalho, é impedir que sejam julgados procedentes os pedidos de desconstitucionalização dos vínculos familiares, se, apesar de não existirem vínculos biológicos, tiver havido afeto e convivência aptos a restar caracterizada a noção socioafetiva parental.
Desta forma, não tem sido questão simples adquirir o direito à nulidade do registro de nascimento, pelo fato de que, para tanto, seria necessário demonstrar, a um só tempo, não haver vínculos biológicos nem socioafetivos entre as partes.
Interessante é a questão da paternidade socioafetiva quando se alinha a um fenômeno denominado adoção “à brasileira”, pois esta se caracteriza como um procedimento ilegal, que, em tese, não poderia gerar, para nenhum efeito, os vínculos familiares almejados pelos “adotantes”.
Neste âmbito da adoção à brasileira, ao perquirir as recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça sobre a prevalência do vínculo socioafetivo frente a outros direitos, tais como o direito à verdade biológica, o que impossibilitaria a anulação do registro de nascimento, notamos certa disparidade de tratamento na solução deste sopesamento, apenas com base no autor da ação levada ao judiciário.
A solução dada pelo superior tribunal tem sido neste sentido: quando a ação de nulidade de registro civil é pleiteada pelo pai que adotou irregularmente, mas é considerado pai socioafetivo, tal ação é julgada improcedente, dando-se primazia à nova noção de família e resguardando os direitos do filho.
A solução é diversa quando o filho adotado de forma ilegal ajuíza uma ação de nulidade de registro civil para desconstituir o vínculo socioafetivo com o pai adotivo, posto que, nesta hipótese, entende o STJ, deva ser dada prevalência ao direito à verdade biológica, de forma que esta ação deve ser julgada procedente.
Diante dessas decisões, algumas indagações merecem ser feitas. O pai que, por razões nobres, tenha adotado uma criança fora do procedimento legal, mas que, tenha dado amor, afeto e cuidados durante toda a vida, deve ser submetido à retirada do seu nome do registro civil do seu filho socioafetivo, caso este se revolte, por algum motivo, ou descubra que seu pai biológico tem melhores condições financeiras, e ajuíze a ação de anulação do seu registro?
Outra coerente questão: o filho que foi adotado “à brasileira” tem o direito à verdade biológica com todos os seus efeitos, mas o mesmo não ocorre com o pai adotivo? Há razão para tal desigualdade no tratamento?
O presente trabalho objetiva analisar e demonstrar os caminhos que a jurisprudência tem traçado com relação à possibilidade de se pleitear a nulidade do registro de nascimento, quando, apesar de ter havido relação socioafetiva, os vínculos familiares tenham se dado no contexto de uma adoção irregular, a “adoção à brasileira”.

1. A PATERNIDADE SOCIOAFETIVA NA ATUALIDADE
1.1. CONCEITO E REPERCUSSÕES
O conceito puramente biológico de família não atende mais aos anseios da sociedade em sua atual conjuntura. A agregação dos seres humanos em grupos, em sociedade, é uma tendência natural e constrói, entre eles, sentimentos de amor, de compaixão, de afeto e de carinho.
Não é incomum que pessoas sem qualquer ligação biológica convivam diariamente e nutram sentimentos de cuidado recíproco. Alguns dados sociológicos e fisiológicos ajudam a explicar esse vínculo, tais como: a infertilidade sexual, as contendas existentes dentro das famílias biológicas, a morte de familiares, o anseio do ser humano pela felicidade e pelo afeto,  etc. Tais fatores, certamente, levaram os indivíduos a procurarem outras formas de se agregarem, de desenvolver laços afetivos e fraternais.
Como é cediço, o Direito tem que se amoldar às mudanças sociais. Dessa forma, o Direito teve que ceder ao conceito apenas biológico de família. O Direito Civil Moderno apresenta como características do novo conceito de família: a socioafetividade, o eudemonismo (busca pela felicidade), e a noção de família anaparental (pessoas sem relação de vínculo biológico).
1.2. ENTRAVE À DESCONSTITUIÇÃO DOS VÍNCULOS FAMILIARES
Com a incorporação pelo Direito Civil de um novo e mais amplo conceito de família, a desconstituição judicial dos vínculos familiares, não pode e não deve mais se basear apenas da demonstração de que não há vínculos biológicos entre os sujeitos do processo.
O Direito não pode mais se restringir a declarar pai e filho, ou mãe e filho apenas aqueles que demonstrem, através do exame de DNA, que descendem tecnicamente do outro.
Dessa forma, O STJ vem se adequando à esta realidade. Conforme a doutrina de Márcio Cavalcante, o STJ já decidiu que a ação negatória de paternidade, para que seja provida, tem que demonstrar, a um só tempo, a inexistência da origem biológica entre os indivíduos e não ter havido relação socioafetiva entre o pai que constar do registro e seu filho. Ressalta, assim, que hodiernamente, não basta que um pai que queira anular o registro civil de nascimento de uma criança demonstre que esta não tem vínculos biológicos com ele, mas também se faz necessário que demonstre que não houve o estabelecimento de vínculos afetivos com a criança.[1]
Diante desse novo panorama, pode-se afirmar que, para que seja declarada a nulidade do registro civil de um filho, seja através de ação negatória de paternidade ou de ação de investigação de paternidade, há de ser demonstrada não apenas que o exame de DNA mostra que os indivíduos não têm relação biológica, mas também que, entre eles, nunca existiu, convivência e afeto, carinho, amor, cuidados, etc.
Consequentemente, encontra-se um entrave a mais para que, judicialmente, sejam desconstituídos vínculos familiares entre pais e filhos.

2. ADOÇÃO “À BRASILEIRA”
2.1. CONCEITO E REPERCUSSÕES
O procedimento para a adoção está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, em seus arts. 39 a 52-D. No ordenamento jurídico brasileiro, é necessário que os postulantes à adoção passem por uma série de requerimentos e procedimentos para que, de fato, adotem uma criança ou adolescente.
Ocorre que muitas pessoas não querem se submeter ao procedimento previsto em lei, por diversos motivos: morosidade da justiça, custas, preferência por uma determinada criança, a facilidade de adotar fora dos ditames da lei, etc.
Conforme demonstra os ensinamentos de Antonia Rocha, as pessoas procuram a adoção à brasileira como um meio de atingir seus objetivos pessoais, mas desconsideram que essa prática irregular pode gerar duas consequências graves, quais sejam, a possibilidade de o registro poder ser anulado posteriormente, o que porá termo à relação de filiação com a criança e também repercussões no âmbito penal, pois a prática de registrar como seu, filho de outra pessoa constitui crime previsto no nosso ordenamento jurídico[2].
A ministra do STJ Nancy Andrighi, no Recurso Especial nº 83.712 -RS (206/07069-4) afirma que a “adoção à brasileira”, caracteriza-se pelo reconhecimento voluntário da maternidade/paternidade, na qual, o casal (ou apenas um dos cônjuges/companheiros) simplesmente registra o menor como sua filha, sem as cautelas judiciais impostas pelo estado[3].
Fica bastante claro que o ordenamento jurídico não permite a adoção “por vias tortas”, ou seja, que não cumpra os requisitos pré-estabelecidos em lei. Conduzir-se desta forma é, inclusive, conduta tida como crime, haja vista o conteúdo do art. 242, do Código Penal.
2.2. IMPOSSIBILIDADE DE DESCONSTITUIÇÃO DOS VÍNCULOS FAMILIARES PELOS PAIS
Diante de todo o exposto acima, nos deparamos com uma situação peculiar: de um lado, vimos que a jurisprudência tem dado ampla proteção à paternidade socioafetiva, e, de outro, vimos que a jurisprudência colide frontalmente com a “adoção à brasileira”.
Dessa forma, o que ocorre quando um pai ou mãe, que adotou uma criança, pelas vias da “adoção à brasileira”, se arrepende de ter adotado, e pleiteia, judicialmente a nulidade do registro civil, cumulada com ação negatória de paternidade, com fundamento na “irregularidade”, por ele mesmo provocada?
Segundo o STJ, o pai que desejar desconstituir esse vínculo, há que pleitear antes de constituir vínculo socioafetivo com o adotado, em conformidade com o novo conceito de família, vide julgado a seguir comentado.
No Resp nº. 1088157 PB 2008/0199564-3, cujo Relator foi o Ministro MASSAMI UYEDA, julgado no dia 23/06/2009, o STJ, numa ação declaratória de nulidade de registro civil, firmou entendimento de que não há a possibilidade de um pai conseguir a nulidade do registro de nascimento de seu “aparente” filho, registrado sob o procedimento da adoção à brasileira, no caso de restar incólume a situação da paternidade socioafetiva.
Considerou, ainda, o STJ, que, em se tratando da adoção à brasileira, a melhor solução para o pai que busque essa anulação do registro civil é ajuizar a ação própria antes de constituído vínculo de socioafetividade com o adotado.
Conforme ressalta Márcio Cavalcante, em sua doutrina, o STJ, no  REsp 1.244.957-SC, já teria decidido também que a conduta de um pai que, pessoalmente, registrou a criança e o fez com consciência e vontade, e, posteriormente, questiona a paternidade em relação a um filho perante o qual já se estabeleceu uma relação de afeto, viola a noção atual de boa-fé objetiva, notadamente a Máxima do Nemo Potest Venire Contra Factum Proprium, que proíbe o comportamento contraditório, prejudicando a outra parte[4].
Conclui-se, assim, que os pais que adotarem através da “adoção à brasileira”, somente poderão ter seus pedidos de desconstituição do vínculo familiar com o adotado julgados procedentes, se, também, provarem ausência de vínculos socioafetivos.
Nota-se que tal entendimento se harmoniza completamente com a nova noção de família pelo Direito Civil Moderno, que dá destaque e relevância justos para os laços de afeto, de amor, de convivência, etc.
2.3. POSSIBILIDADE DE DESCONSTITUIÇÃO DOS VÍNCULOS FAMILIARES PELO FILHO
Outra situação muito curiosa diz respeito à solução do seguinte caso: o adotado (através da adoção à brasileira), pleiteia, por qualquer motivo, a nulidade de registro civil, cumulada com ação de investigação de paternidade, para saber quem, de fato são seus genitores e desconstituir, com os adotantes, vínculo familiar, apesar de restar clara a relação socioafetiva entre o adotado e os adotantes.
Na esteira do que a doutrina e a jurisprudência vêm entendendo como definição de família e da importância que se tem dado aos vínculos socioafetivos, pensar-se-ia que a jurisprudência iria dar a este caso a mesma solução que deu ao caso anterior, no qual os pais pleiteavam a nulidade do registro.
No entanto, o STJ, no Resp 833.712/RS, firmou a tese de que, neste caso, a ação poderá ser julgada procedente, mesmo que tenha havido relação socioafetiva entre adotantes e adotado.
No julgado, afirmou o STJ que o princípio fundamental da pessoa humana, esculpido na Constituição pátria, traz consigo o direito à identidade biológica. Nesta esteira, caracterizar-se-ia uma violação ao princípio da dignidade da pessoa humana impedir um indivíduo de conhecer sua origem genética, pois haveria uma necessidade humana em se conhecer a verdade biológica.
Afirma, ainda, o STJ que, apesar de o filho crescer em lar adotivo e regado de socioafetividade, nada lhe retiraria o direito de ter acesso à sua real história (que lhe foi usurpada), pois, além do mais, não se deve corroborar a ilicitude perpetrada pelos pais adotivos e a omissão praticada pelos pais biológicos.
Consta do julgado que o reconhecimento de filiação constitui direito personalíssimo, indisponível, imprescritível, e que pode ser exercitado sem qualquer restrição, em face dos pais ou seus herdeiros.
Arremata o superior tribunal, afirmando prevalecer o direito ao reconhecimento do vínculo biológico, em detrimento da paternidade socioafetiva.
Observe-se que, a controvérsia objeto do Resp 833.712/RS, em sede estadual, no Tribunal respectivo, teve solução diversa, na qual o Tribunal afirmou que “em se tratando de “adoção à brasileira”, "a verdade socioafetiva se sobrepõe à verdade genética".
Para a doutrina, a decisão do STJ revela que a “adoção à brasileira”, ao contrário do que ocorre com a adoção legal, não tem o poder de romper os vínculos civis entre o filho e os pais biológicos, vínculo este que deve ser restabelecido sempre que o filho desejar ver seu registro (ilegalmente levado a efeito) desfeito. Assim, restaurar-se-iam todas as consequências legais da paternidade biológica, como as questões registrais, patrimoniais e hereditárias[5].
Conforme pondera Adriana Karla de Lima, nos casos da adoção à brasileira, apesar de os pais saberem da ilegalidade, pautam-se muito mais pela qualidade de vida que desejam dar ao menor. Mas, o entendimento de alguns tribunais em julgados é de que o anseio do adotado na identificação biológica seria maior que a conduta benevolente dos adotantes[6].
Nota-se, assim, que o STJ deu um tratamento diferente para questões inseridas num mesmo contexto: a existência de relação de socioafetividade, de um lado; e, de outro, uma adoção feita de forma irregular.
No caso dos pais, estes não poderão anular o registro civil se tiver havido relação socioafetiva. No caso dos filhos, eles poderão anular o registro civil, mesmo que tenha havido relação socioafetiva, a qualquer tempo e sem restrições.
Há que se perquirir se o Direito não estaria, neste caso, conferindo proteção demasiada à busca da verdade biológica em detrimento do sentimento de família, gerado nos pais, que, apesar de terem adotado de forma irregular, criaram, sustentaram e deram afeto e amor ao adotado, às vezes, por décadas.
Neste caso, não restariam desamparados os direitos dos pais adotantes? Seria mesmo correto puni-los, imprescritivelmente, por uma “adoção à brasileira”, mesmo se esta não tiver decorrido de dolo ou de más intenções nem tiver ensejado nenhum tipo de mal ao adotado?
No caso dos filhos, o que restou firmado, no STJ, é que seus direitos não poderiam restar preteridos, em tendo havido afeto. Mas, e os direitos dos pais? Estariam eles, então, sujeitos à desconstituição do vínculo familiar com o adotado, a qualquer momento em que este desejasse?
Neste caso, dever-se-ia aplicar a conhecida fórmula jurídica romana, segundo a qual "Onde há a mesma razão, aplica-se o mesmo direito" ("ubi eadem ratio, ibi eadem jus").

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da nova noção de família, trazida pelo Direito Civil Moderno, englobando a característica da socioafetividade, o Direito passou a ter que se adequar à nova realidade social.
Finalmente, a jurisprudência reconheceu a noção de família socioafetiva e têm dado a ela ampla proteção e reconhecimento. Para que um pai adotivo, hoje, tenha deferido seu pleito de retirar seu nome do registro de nascimento civil de uma criança, tem que, a um só tempo, demonstrar que não é o pai biológico e nem pai socioafetivo.
Em regra, num contexto de uma adoção regular, que seguiu os trâmites legais, rompe-se os vínculos com os pais biológicos, de forma que o filho não poderá pleitear a desconstitucionalização dos vínculos com os pais adotivos.
Porém, no contexto da “adoção à brasileira”, que é uma situação de adoção irregular, sem os trâmites legais, proibida pelo ordenamento jurídico, constituindo crime a conduta de registrar como seu o filho de outrem, o Superior Tribunal de Justiça tem desenvolvido a tese de que é possível que o filho pleiteie a anulação do registro de nascimento, mesmo contra o pai socioafetivo.
Sobre o tema, nos deparamos com uma disparidade de tratamento pelo STJ no que diz respeito a situações dentro de um mesmo contexto: na situação em que o filho pugne pela desconstituição dos vínculos familiares, apesar da relação socioafetiva firmada, poderá ele obter a nulidade do registro civil e ver julgada procedente a ação de investigação de paternidade; por outro lado, no caso dos pais, não lhes será permitido anular o registro civil, se tiver havido relação socioafetiva com o adotado.
O STJ, percebe-se, ainda dá prevalência à verdade biológica em detrimento da paternidade socioafetiva apenas quando o autor da ação for o filho, mostrando-se dissonante da linha de raciocínio que vem firmando a jurisprudência e a doutrina acerca da amplitude do conceito de família e da proteção que deve ser-lhe dada.
Nos tempos modernos, o Direito deve “reconhecer” que muitas situações da vida fogem ao procedimento que as leis as impõem. Podemos pensar em algumas razões para isso: nosso país tem um território de dimensões monstruosas e as disparidades regionais são saltitantes. Nossa população é, em sua grande maioria, formada de pessoas simples, humildes, leigas e pobres.
No entanto, essa população não deixa de se relacionar, de almejar amor, afeto, proximidade com seus pares, construir uma família e realizar os seus sonhos. É neste contexto que, muitas vezes, surge a adoção ilegal. Nem sempre com dolo ou má-fé. Muitas vezes, com um amor inimaginável por muitos juristas.
Desta feita, se o Direito tem por sua finalidade precípua buscar realizar o ideal de justiça, nada mais justo do que reconhecer definitivamente e para qualquer das partes de um processo, a prevalência da parentalidade socioafetiva, quando bem demonstrada faticamente e nos autos.
Não procede bem o julgador que faz restar desprotegido o direito de um pai socioafetivo de ver-se reconhecido como o pai daquela pessoa que ele criou uma vida toda, apenas porque o filho assim não o quer mais. Não há razoabilidade em decisões que demonstrem uma interrupção no desenvolvimento da proteção aos laços socioafetivos.
A característica da socioafetividade deve ser ampliada e, cada vez mais difundida e utilizada, devendo prevalecer tanto para proteger os vínculos familiares quando estes são ameaçados pelos pais, quanto quando sejam ameaçados pelo filho, mesmo no contexto da “adoção à brasileira”.
Onde há a mesma razão, deve haver o mesmo Direito. Se um “pai” irresponsável ou ingrato, registrou como seu filho de outrem indevidamente e quer desfazer esse registro, a ele não é dado esse direito se há com o filho relação de afeto. Da mesma forma, se um filho ingrato quer ver-se livre daquele pai socioafetivo que não o fez mal algum, também não lhe deve ser dado este direito.
Não se está, no presente trabalho, incentivando ou até tutelando procedimentos que sejam feitos fora dos trâmites legais. Mas, se, modernamente, há um novo conceito de família, esses casos devem ser encaixados nesta possibilidade e ambas as partes desta ação de nulidade de registro civil devem ser protegidas.
Nesta esteira, nossa humilde opinião quanto às questões postas é que deve o STJ rever seu posicionamento, a fim de alinhar-se com suas próprias teses protetivas no que concerne ao instituto da família, impossibilitando o filho que foi adotado através da adoção “à brasileira”, de desconstituir os vínculos parentais com os pais, quando restar demonstrado que, embora a adoção tenha se dado fora dos trâmites legais, os pais cumpriram os deveres legais inerentes à paternidade e uma relação socioafetiva harmoniosa foi desenvolvida e sedimentada.

Referências
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Adoção à brasileira e a (im)possibilidade de anulação do registro segundo o STJ. Disponível em: <http://marciocavalcante2.jusbrasil.com.br/artigos/121942721/adocao-a-brasileira-e-a-im-possibilidade-de-anulacao-do-registro-segundo-o-stj> Acesso em: 05 de setembro de 2014.
DECRETO-LEI No 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940. Código Penal. Disponível em: Acesso: 04 dez. 2014.
JUSBRASIL. Sítio Eletrônico. Disponível em: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/18352/recurso-especial-resp-833712-rs-2006-0070609-4 acesso em: 4 dez. 2014.
Lei nº 8.069/90. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: <www.planalto.gov.br>  Acesso em 05 de setembro de 2014.
LIMA, Adriana Karlla de. Reconhecimento da paternidade socioafetiva e suas consequências no mundo jurídico. Âmbito Jurídico, Rio Grande, v. XIV, n. 88, maio 2011. Disponível em: . Acesso: 05 de setembro de 2014.
LOBÃO, Maiane Rodrigues Corrêa. A possibilidade de reversão da adoção à brasileira frente ao princípio da socioafetividade. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/30896/a-possibilidade-de-reversao-da-adocao-a-brasileira-frente-ao-principio-da-socioafetividade.> Acesso: 05 de setembro de 2014.
ROCHA, Antonia Torres da. Adoção à Brasileira: Aspectos Relevantes. Disponível em: <http://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/trabalhos_conclusao/1semestre2010/trabalhos_12010/antoniarocha.pdf> Acesso em: 4 dez. 2014.
 
Notas
[1] CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Adoção à brasileira e a (im)possibilidade de anulação do registro segundo o STJ. Disponível em: Acesso em: 05 de setembro de 2014.
[2] ROCHA, Antonia Torres da. Adoção à Brasileira: Aspectos Relevantes. Disponível em: Acesso em: 4 dez. 2014.
[3] JUSBRASIL. Sítio eletrônico. Disponível em: Acesso em: 4 dez. 2014.
[4] CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Adoção à brasileira e a (im)possibilidade de anulação do registro segundo o STJ. Disponível em: Acesso em: 05 de setembro de 2014.
[5] CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Adoção à brasileira e a (im)possibilidade de anulação do registro segundo o STJ. Disponível em: Acesso em: 05 de setembro de 2014.
[6] LIMA, Adriana Karlla de. Reconhecimento da paternidade socioafetiva e suas consequências no mundo jurídico. Âmbito Jurídico, Rio Grande, v. XIV, n. 88, maio 2011. Disponível em: . Acesso: 05 de setembro de 2014.
Jéssica Talita Alves Ramos Bacharela em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Pós-graduada em Direito Civil pela Universidade Anhanguera Uniderp. AdvogadaÂmbito Jurídico

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