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sexta-feira, 18 de maio de 2018

Terry Crews sobre masculinidade tóxica: 'Os homens precisam ser desprogramados'

ILLUSTRATION: DAMON DAHLEN/HUFFPOST PHOTOS: GETTY
Terry Crews, o eterno Julius da série Todo Mundo Odeia o Chris, não está aqui para essa história de machões.
"A masculinidade pode ser um culto", disse Crews no evento Women in the World, realizado em abril. "E, quando digo 'culto', não é diferente de David Koresh [líder de uma seita que causou a morte de 80 pessoas]. Não é diferente de Jim Jones [que foi líder do culto Templo dos Povo, famoso pelo suicídio em massa e assassinatos de 918 pessoas em Jonestown, na Guiana, em 1979].
E o ator de Brooklyn Nine-Nine conhece bem o preço da masculinidade tóxica.

Em meio ao acerto de contas do movimento Me Too, no final do ano passado, Crews acusou publicamente o executivo de Hollywood Adam Venit de apalpá-lo numa festa, em 2016. A história virou uma plataforma para vários outros homens vítimas de ataques sexuais e lembrou o público de que eles também são vítimas. Mas não tem sido fácil para Crews.
"Quando entro num ambiente, os caras estão divididos ao meio em relação a mim e à minha história", disse Crews ao HuffPost. "Mas estou OK."
Crews denunciou Venit em dezembro, mas a procuradoria de Los Angeles não levou o caso adiante porque o crime prescreveu. Apesar de Venit não ser alvo de um processo criminal, ele ainda tem de responder perante a justiça civil.
Apesar de seu nome estar em evidência nos últimos meses, o ativismo não é novidade para Crews. O ex-jogador profissional de futebol americano, marido e pai de cinco filhos defende as mulheres e critica os papeis de gêneros restritivos. Em 2014, ele publicou o livro Manhood: How to Be a Better Man – or Just Live With One (Masculinidade: Como Ser um Homem Melhor - Ou Apenas Viver Com um Deles, em tradução livre). Desde então, ele vem denunciando o sexismo, oferecendo apoio a vítimas de ataques sexuais e defendendo o feminismo.
Recentemente, Crews foi apontado numa lista da revista Time junto com outras pessoas que romperam o silêncio, na edição da Pessoa do Ano. Ele também está sendo homenageado com a cofundadora do movimento Me Too Tarana Burke no evento Champion Awards Gala, da entidade Safe Horizon.
Crews conversou com o HuffPost sobre a experiência de vir a público com sua história e os próximos passos em sua luta contra o "culto" à masculinidade.
Como é ser um hétero negro que veio a público contar uma história de ataque sexual?
É muito, muito difícil, porque você enfrenta uma mentalidade que está enraizada em nossa cultura há muito, muito tempo. O que descobri é que as pessoas esperam que um cara como eu seja sempre durão. Mas a verdade é que, sendo negro, a única ocasião em que te consideram vítima é quando você está morto. Do contrário, você não se machuca, não se cansa... as pessoas acham que você vai ficar pulando no ar, de uma enterrada para a outra.
Uma coisa que descobri é que, como disse George Orwell, "em tempos de engano universal, falar a verdade torna-se um ato revolucionário". Estou apenas falando a minha verdade. Estou só dizendo que isso é ridículo e inaceitável. Ninguém – homem, mulher ou criança – deveria ter de aturar ser tratado como menos que humano. Jamais.
Sendo negro, a única ocasião em que te consideram vítima é quando você está morto.
Terry Crews
Os Estados Unidos estão cheios de teorias da conspiração, mas você nunca consegue prová-las. Mas cumplicidade – cumplicidade é outra coisa. Você consegue provar cumplicidade. Cumplicidade é um sistema. Cumplicidade é fazer vista grossa. Cumplicidade é ninguém falar nada, ninguém fazer nada a respeito dessas coisas erradas. Isso é um sistema cúmplice. É o que temos aqui.
Num evento recente você disse que a "masculinidade pode ser um culto". Poderia falar mais sobre isso?
Amo ser homem. Sou pai. Sou marido. Adoro o que é ser homem. Mas, quando você distorce essa definição, quando de repente eu tenho de fazer tudo o que você diz para ser homem – isso é culto. Porque cultos são [mecanismos de] controle. Se você sair da linha, vamos te matar. É disso que se trata. Quem se afasta do que eles consideram masculinidade vira alvo.
Sou culpado disso também. Não estou aqui para apontar o dedo para ninguém. Era membro de carteirinha e, de repente, acordei para a realidade. Disse para mim mesmo: "Vocês entenderam tudo errado". Acho que escapei de uma boa, porque poderia ter vivido e morrido fazendo parte dessa coisa. Tive de ser desprogramado, por assim dizer.
Quais são os próximos passos para o movimento Me Too dos homens, seja como vítimas ou aliados?
Os homens estão com medo. Muito, muito medo. Acho que temos de admitir. Precisamos que os homens admitam. Eles têm de dizer: 'Sabe o que? Estamos errados, fizemos cagada". Digo para as pessoas que vai ser complicado. Não vai ser uma transição suave.
Sim, essas questões sistemáticas vão demorar um bom tempo para ser corrigidas.
Exato. Vai demorar porque estamos falando da mentalidade das pessoas. Estamos falando de mentalidades muito arraigadas. Mas é bom que estejamos falando do assunto. Dez anos atrás você nem tinha como tocar no assunto. A próxima geração está aprendendo desde cedo, meu filho e minha filha estão crescendo num mundo diferente do meu.
Esse acerto de contas do Mee Too parece ter atingido alguns homens, mas nem todos. É alarmante que [o cantor de R&B] R. Kelly tenha sido acusado de ataques sexuais, estupro escravidão sexual por dezenas de mulheres e menores de idade, mas isso não afetou a imagem dele.
Qual sua opinião sobre R. Kelly e a campanha recente por justiça para as vítimas do cantor, especialmente a justiça para mulheres negras?
A questão é que tem homens em manifestações do Black Lives Matter [Vidas Negras Importam] olhando para mulheres e dizendo: "Senta, vadia". E, pera lá, estamos falando de igualdade. Mas eles não consideram as mulheres iguais dentro da sua comunidade. A questão R. Kelly era tipo: "Cara, ele está só sendo homem". Está fazendo o que todo cara faz.
Os homens precisam ser desprogramados.
Terry Crews
É maluco para mim porque, de novo, os homens precisam ser desprogramados. É tipo uma dissonância cognitiva. As mulheres dizem isso faz tempo. Infelizmente, precisamos que um homem fale. Os homens precisam chamar a atenção dos outros homens.
Precisamos de que alguém do grupo dos culpados acorde e diga: "Temos de parar com isso". Acho que tem muitos caras que estão começando a entender, mas precisamos de mais. Acho que a coisa mais importante de que precisamos é continuar conversando. Precisamos continuar essa conversa.
Depois de contar minha história, milhares de homens, na internet ou pessoalmente, me disseram: "Mano, isso aconteceu comigo". Eles dizem: "Cara, obrigado, obrigado por falar". Assim é que sei que estou fazendo a coisa certa.
A entrevista foi editada e condensada.

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